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sexta-feira, 27 de abril de 2012

Luiz Cosme - Salamanca do Jarau (lenda-bailado)



Luiz Cosme nasceu na cidade Porto Alegre em 9 de março de 1908. A casa da família Cosme era o ponto de encontro da fatia gaúcha do movimento modernista, que incluía os escritores Augusto Meyer e Theodomiro Tostes e os compositores Armando Albuquerque e Radamés Gnattali. No período em que compôs o bailado "Salamanca do Jarau", Cosme dialogava tanto com os modernistas andradianos, quanto com Villa-Lobos, firmando-se em sua própria posição entre os dois polos. Relacionou-se também com o diametralmente oposto  Música Viva, de Koellruetter, embora nunca tenha integrado o grupo. Diria ele mesmo que foi o primeiro brasileiro a usar a técnica dos doze sons sem nenhuma sujeição escolástica, antes como meio expressivo e sem descaracterizar a atmosfera brasileira (vide Lambe-Lambe e Madrugada no Campo). O bailado que ora apresentamos foi estreado em 1935 pela a Orquestra Sinfônica do Teatro Municipal do Rio de Janeiro, sob a regência de Heitor Villa-Lobos, tendo sido bastante bem recebido pela crítica e pelos músicos. A partir do final da década de 1940, uma doença não identificada comprometeu seriamente sua mobilidade e interrompeu sua atividade como compositor. A partir daí, dedicou-se à produção de numerosos ensaios e livros sobre diversos temas ligados à música. Faleceu em casa no 17 de julho de 1965. 

A lenda-bailado Salamanca do Jarau tem sua construção baseada no conto homônimo de J. Simões Lopes Neto (aqui, p. 5 e seguintes). Todavia, excetuando-se a Introdução e o Desencantamento, a partitura refere-se apenas à sétima parte do conto, onde são narradas as sete provas por que Blau Nunes tem de passar dentro da furna a fim de desencantar o Santão e a princesa moura, transformada em Teiniaguá (lagartixa). A Introdução apresenta a ideia fixa da obra, a toada folclórica Boi Barrosoque Blau  canta enquanto procura o místico animal pelo Cerro do Jarau.  Outro tema que que permeia a  obra é remanescente da Oração à Teiniaguá (para violino e piano, de 1932, contida no disco A Música de Porto Alegre - Erudito I), que aqui aparece como Tema da Teiniaguá, além de outro oriundo da peça Sacy Pererê (presente no mesmo disco) que é utilizado em Tropa de Anões. São claros na composição ecos da Sagração da Primavera de Stravinsky, quem Cosme considerava "o maior compositor vivo" de sua época



I. Introdução - No Rastro do Boi Barroso (0:00 - 4:50)
II. Assombração (4:50 - 7:57)
III. Jaguares e Pumas (7:57 - 9:07)
IV. Dança dos Esqueletos (9:07 - 10:58)
V. Línguas de Fogo (9:07 - 12:32)
VI. A Boicininga (12:32 - 14:42)
VII. Ronda de Moças (14:42 - 17:46)
VIII. Tropa de Anões (17:47 - 19:25)
IX. Desencantamento (19:25 - 23:42)



Orquestra Nacional da Rádio MEC
Mario Tavares, regente
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OBS.: Devo meus agradecimentos ao anônimo que disponibilizou essa gravação raríssima por aí. Caso contrário, o único registro que teríamos seria este, precariamente gravado por mim no ano passado com a OSPA, sob a direção de Ligia Amadio.


Para ir mais além:
- MATTOS, Fernando Lewis de. A Salamanca do Jarau de Luiz Cosme: análise musical e história da recepção crítica. Dissertação (Mestrado), PPGM, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 1997.
- MATTOS, Fernando Lewis de. Estética e Música na obra de Luiz Cosme. Tese (Doutorado), PPGM, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2005.
- LOPES NETO, João Simões. Lendas do Sul. Porto Alegre: Artes e Ofícios, 2002 (está em domínio público: http://pelotas.ufpel.edu.br/ebooks/lendasdosul.pdf)
- PAULA, Elisângela Aparecida Zoborosi de. As Origens da Lenda "A Salamanca do Jarau" de Simões Lopes Neto. Revista Virtual de Letras, v. 2, n. 2, 2010.
- COSME, Luiz. Introdução à Música. Rio de Janeiro: Editora Globo, 1954.
- COSME, Luiz. Música, sempre música. Rio de Janeiro: Editora Globo, 1959.


Abaixo um ensaio do próprio Cosme, publicado no livro Música, Sempre Música, de 1959, em que ele contrasta o conto de Simões Lopes Neto, base de seu bailado, com uma descrição da peça do compositor e crítico gaúcho Paulo Guedes:
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         Às vezes, afigura-se-nos leviano o juízo de atribuírem a nós o título de anti-foiclorista ou dizerem que detestamos o folclore. Cremos que este equívoco nasceu de uma monografia de Vasco Mariz: Figuras da Música Brasileira Contemporânea, num tre­cho em que o autor, escrevendo a nosso respeito, diz o seguinte: “Assim como Duparc, o músico gaúcho destrói, sem piedade, as composições que não lhe agradam in totum. Detesta o folclorismo direto, preferindo criar ambientes populares a harmonizar temas alheios”. 
         Eis o que se pode chamar de verdadeiro engano, porque, a nosso ver, o autor, ao referir-se a folclorismo direto — no trecho acima citado — quis evidenciar que o uso do material folclórico não é limitado à introdução esporádica ou à imitação de velhas melodias e mesmo ao seu uso temático arbitrário em obras de tendências internacionais. 
          [...]
         Pelo exposto, verifica-se que eu não detesto o folclore, acho simplesmente que o seu uso não deve ficar limitado a um simples aproveitamento de ritmos e cadência, e, sim, de uma elaboração musical desses elementos populares. Seria mesmo absurdo se tal não fosse o meu pensamento, pois basta recordar a formação popular na Ars Nova italiana e francesa do século XIV, e ainda a influência popular na ópera italiana.
(COSME, Luiz. Introdução à Música. Rio de Janeiro: Editora Globo, 1954. pgs. 63 e 75)


quarta-feira, 18 de abril de 2012

Villa-Lobos: Piano Music (Cristina Ortiz, piano)


 

 01-04 Bachianas Brasileiras nº4
05-11 Seleção do "Guia Prático"
12 Poema Singelo
13 Caixinha de música quebrada
14 Saudades das selvas brasileiras nº2
15-17 As três Marias
18 Valsa da dor
19 Cirandas - nº14. A canoa virou
20 Cirandas - nº4. O cravo brigou com a rosa
21-24 Ciclo brasileiro

Cristina Ortiz, piano

London
1987

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terça-feira, 3 de abril de 2012

Camargo Guarnieri - Sonatas para Violino 2, 3 e 7; Canção Sertaneja


Violin Sonata No. 2
1 - Sem pressa em bem ritmado
2 - Profundamente terno
3 - Impetuoso

Violin Sonata No. 3
4 - Moderato expressivo
5 - Terno
6 - Decidido

Violin Sonata No. 7
7 - Enérgico
8 - Magoado
9 - Com alegria

10 - Canção Sertaneja: Dolentemente

Lavard Skou Larsen, violino
Alexander Müllenbach, piano


Falar de Guarnieri, ainda mais aqui, e ainda mais eu, é chover no molhado. Me limito à reprodução do texto do encarte, que, sinceramente, está recheado de comentários por vezes bastante óbvios ou esquisitos, só vale a pena por uma ou outra ideia ou informação... Aos interessados pelo aspecto técnico violinístico nestas sonatas, há esse ótimo artigo de André Cavazotti, que analisa as técnicas utilizadas e compara as 6 sonatas de Guarnieri (que começam a contar da 2ª) e revela que apesar de quase todo o vocabulário violinístico utilizado nas sonatas de Camargo Guarnieri pertencer ao idioma virtuosístico do século XIX, a proeminência do intervalo de quarta e o uso de uníssonos, segundas, quartas e quintas em cordas duplas em passagens acentuadamente rítmicas assemelha-se ao idioma violinístico de dois compositores nacionalistas, Bartók e Kodály. Atenção também à fantástica Canção Sertaneja, muito singela e inspirada. Uma ótima audição!


Em "Sonata par Violino nº 2", 1993 o piano abre o primeiro movimento, marcando "Sem Pressa e Bem Ritmado" com temas replicados pelo violino. É uma música com alto grau de tensao, atenuada pela melancolia quando o violino trata o tema principal com extremo sentimento, até o término da música. A abertura do segundo movimento, marcada por "Profundamente terno", é gentil e pungente até que o piano introduz uma passagem mais forte, à qual o violino replica, agora de maneira a evidenciar o estilo brasileiro - uma influência de "Saudades", tributo de Milhaud ao Brasil, prasenteiro mais também saudoso. O terceiro e último movimento corajosamente quebra o clima. "Impetuso" utiliza integralmente o tema de abertura da sonata e as passagens correspondentes, num movimento que desliza entre a tristeza, a energia e o drama, evolando-se em melodia suave, para depois retornar à impetuosidade do início, com um violino que repetidamente lembra a voz humana, até que outros violinos levam à conclusão da peça.
A "Sonata nº3" também é aberta pelo piano, em cadência marcial que logo é compartilhada pelo violino, definindo o estilo italiano de "Moderato Expressivo": o fluxo da música é bruscamente interrompido pelo piano, seguido por passagens de violino solo novamente imerso em melancolia, enquanto se desenrola um duelo entre os dois instrumentos. Como na Sonata nº 2, o violino assume um papel retórico, quase que vocal e uma passagem frenética conclui o movimento. No segundo movimento, "Terno", traz uma abertura delicada, cuja sensibilidade vai se exacerbando até chegar a um clímax agitado, seguido por uma maior tranquilidade à medida em que o movimento chega ao final. O formato do terceiro movimento permite que em seu início haja um contraponto finamente delineado entre os dois instrumentos, o que a princípio se traduz em harmonia predominantemente linear, com clara influência de ritmos e contornos melódicos brasileiros, que culminam num instigante final.
Diz-se que Guarnieri perdeu sua primeira sonata para violino num taxi e que nunca a reescreveu; assim, sua sexta sonata é chamada "Sonata para Violino nº 7". Composta entre 1977 e 1978 e nunca publicada, inicia-se com violino e piano juntos, no primeiro movimento. Novamente observa-se a abordagem distintamente retórica na partitura, em especial para o violino, com os dois instrumentos frequentemente em execuções antífonas, por vezes travando diálogos ríspidos. O segundo movimento, "Magoado", mescla tristeza e amargura: o piano introduz as primeiras notas, compartilhadas pela pungente melodia do violino, resultando numa música em que a livre harmonia, aliada a um sentimento intenso, é aprimorada até o portamento final do violino. "Alegria" tem mais a ver com a velocidade que com alegria propriamente dita. A música varia da percussão áspera até o intenso, com contrapontos de Hindemith e, pelo menos em sua abertura, conta com a influência do onipresente violino, pontuado por intervenções sincopadas do piano. O charme de "Canção Sertaneja" reside na eventual austeridade e na exagerada melancolia que permeiam as 3 sonatas; Guarnieri trata a música sertaneja com muito carinho e indulgência.


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